A geração de maranhenses que tem entre 40 e 70 anos guarda na memória as boas lembranças dos carnavais no interior do Estado onde todos aproveitavam o feriado prolongado para brincar com parentes e amigos num clima mais tranquilo de cidade pequena sem ter que se preocupar com os problemas do cotidiano da vida na capital.
Eu nunca gostei muito de carnaval, todos sabem que a minha preferência sempre foi o rock and roll, ainda mais depois de um “trauma” na adolescência na Marques de Sapucaí onde fui praticamente obrigado a passar a noite toda na arquibancada assistindo o desfile das escolas de Samba, para piorar ainda tomei um porre de malt 90, cerveja muito popular na época. Mas a melhor lembrança que tenho do carnaval do Rio é o bloco Cacique de Ramos que fazia o cortejo pelo centro da cidade com suas fantasias de origem indígena contagiando todos por onde passava, era a essência do verdadeiro carnaval de rua.
No ano seguinte vim conhecer meus parentes no Maranhão e fui passar o carnaval em São Bento, cidade natal da minha mãe, era a oportunidade de conhecer a outra parte da minha família. Não me recordo o ano, mas era no final dos anos 80 e sinceramente não tinha muita esperança naquele carnaval, afinal estava acostumado com a “grandiosidade” da festa carioca, mas logo no primeiro dia percebi um clima diferente nas pessoas, geste simples com caixas de maizena nã mão sem se preocupar com a aparência, havia barracas de palha na Praça Carlos Reis e um pequeno palco na lateral onde a banda astral tocava todos os dias, já a rua principal era liberada para o desfile das escolas de samba e blocos, com destaque para a Relaxo do Samba, vencedora daquele ano.
Sinceramente foi o melhor carnaval que já tive, alias foi um dos poucos que me permiti a ver com outros olhos, ali as pessoas não estavam nem aí para mega estruturas, artistas nacionais, elas queriam apenas se divertir. Tudo era animado por nomes da cidade e mesmo com o pouco apoio do poder público que tinham entregavam uma alegria contagiante para todos da cidade. A prefeitura por outro lado não precisava comprometer suas receitas com custos exorbitantes como é nos dias de hoje.
E é justamente esse ponto que gostaria de abordar, os gastos exorbitantes de dinheiro público no carnaval.
Infelizmente no Maranhão os gestores passaram a tratar o carnaval como política pública destinando verbas pomposas para satisfazer seus egos travestidos de produtores culturais em busca de likes em redes sociais, anunciando com euforia atrações que levam a maior parte da fatia das verbas enquanto representantes da cultura local tem que se contentar com cachês ajustados de acordo com a sobra do orçamento.
O mais curioso é que essas atrações ditas mais famosas foram perdendo espaço no mercado privado e para sobreviver direcionaram seu modelo de negócio para governos estaduais e municipais, afinal só eles possuem caixa para bancar todas as enormes exigências contratuais praticadas hoje em dia. São mega estruturas de palco, som, iluminação, painéis de led, passagens aéreas e aquelas regalias “básicas” para não deixar o artista estressado na hora de fazer o selfie com quem está pagando a conta com gordura para ambos os lados.
Uma luz no fim do túnel seria a atuação do Ministério Público, promotores de algumas comarcas até tem tentado coibir os excessos, porém falta uma espécie de “súmula vinculante” criando critérios claros, escalonados no tange o gasto de dinheiro público com eventos dessa natureza e principalmente para evitar interpretações caolhas da lei como vem acontecendo com o governo estadual e a prefeitura de São Luís onde destinam milhões em verbas debaixo dos olhos do MP e nada acontece.
Por fim é decepcionante ver o tão criticado pão e circo ser adotado como instrumento de doutrinação popular por gestores que pregam exatamente o contrário durante as suas campanhas e não importam se são de direita ou esquerda, as promessas são as mesmas e as atitudes infelizmente também.
Enquanto isso vamos tornar a assistir a reclamação do valor destinado ao apoio as escolas de samba locais ao mesmo tempo em que já vimos a liberação de 1 milhão para apenas uma escola do Rio de Janeiro. Vamos acompanhar também a desmontagem da “cidade do samba” e depois testemunhar o túmulo vazio do saudoso Circo da Cidade.
Será que não valeria a pena deixar de investir numa estrutura arranjada por 20 dias no centro histórico e erguer em definitivo o Circo da Cidade?
Dayse Waldorf
O Maranhão não tem mais jeito.