O jogador de vôlei, Wallace Leandro (Cruzeiro) – como não acompanho este esporte não sabia quem era até a tarde desta terça-feira (31) – quando ele postou em suas redes sociais uma enquete em que perguntava aos seguidores se teriam coragem de alvejar à queima-roupa, com “um tiro na cara”, o presidente da República, Lula. Em seguida a postagem foi apagada. Imediatamente a internet entrou em polvorosa. Em defesa e ataque ao atleta os internautas entraram em campo; ministro da Secretaria de Comunicação Social, Paulo Pimenta, afirmou que havia acionado a Advocacia Geral da União (AGU) para tomar providências sobre uma postagem; a Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) lançou a boa, velha e ineficaz, nota de repúdio. Na prática, só o Cruzeiro foi um pouco mais adiante e tomou uma medida prática sobre o caso, afastando-o por tempo indeterminado.
O blog Olhar Olímpico, do portal UOL, revelou que a Universidade Federal do Paraná (UFPR) fez um levantamento de dados constatando que Wallace recebeu R$ 308 mil do Bolsa Atleta, programa de incentivo ao esporte criado pelo petista, em 2005, pelo governo petista.
Pois bem, não me surpreende que mais um beneficiário de programas assistenciais ou de incentivo criados pelos governos petistas tenha essa atitude, de esquecer de onde veio e como chegou até aqui. Já beneficiários do PROUNI, FIES, Ciência sem Fronteiras, bolsas da CAPES de iniciação científica, iniciação à docência, mestrado, doutorado e pós-doutorado. Sem contar outros programas como o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida. É vida!
Também chamo atenção para a presença de um repertório de procedimentos que tem se tornado protocolar entre extremistas de direita desejosos de atenção midiática e aspirantes a cargos públicos eleitorais, ou não. Tal repertório começou a se constituir a partir das experiências nas redes sociais do ex-presidente da República, Jair Bolsonaro, fruto de uma estratégia desenvolvida nas entranhas do conhecidíssimo do “gabinete do ódio”.
Esse repertório de procedimentos consiste, entre outras coisas, em um conjunto de ações protocolares que são padronizadas: publicação nas redes sociais de fake News, alguma incitação ou apoio a ilegalidade, propagação de pautas reacionárias e profundamente intolerantes. Enfim, tudo aquilo considerado pelo extremismo de direita como pautas que fazem parte da agenda fascista “Deus, Pátria e Família” que confronte o “comunismo ateu gayzista bolivariano” pode vir a ser objeto destas postagens. Em seguida, espera-se a repercussão da postagem para que ela possa ser apagada, mas é sabido que o estrago já foi feito porque “a internet não perdoa”. Mas, a repercussão e a comoção em defesa e ataque são planejadas e desejadas pelo autor da postagem. Principalmente se forem acompanhadas de retaliações por parte das autoridades. Decisão judicial de desativação das redes sociais, abertura de inquérito, é o senho de consumo de quem faz esse tipo de publicação. E quanto mais pancadas institucionais vierem, melhor.
Diante disso tudo a pessoa imediatamente vai inverter a situação e passará a se colocar como vitima de perseguição e censura. Por vezes, fará um pedido público de desculpas que na verdade é um recuo estratégico e uma demonstração de falso arrependimento, muito mais por conta de prejuízos financeiros decorrentes da postagem. Isso quando o tal pedido de desculpas não se transforma em um novo ataque. Evocará os valores democráticos os quais desconhece ou simplesmente despreza; alegará que é um “cidadão de bem”, defensor dos imaculados “valores cristãos”, da “família tradicional” e do “patriotismo”.
Assim entramos na etapa do repertório em que os influencers extremistas abraçam “nosso herói” (toneladas de ironia). Ele passará a ser figurinha carimbada em lives pela internet afora (podcasts, Youtube, Facebook…). Haverá convites para compor a bancada de comentaristas de programas exibidos no submundo das comunicações e/ou para se filiar a algum partideco de extrema-direita. E, no caso específico do atleta objeto deste texto opinativo, cuja carreira já se encontra no ocaso, por que não cogitar o início de uma carreira política. Inclusive, caminho semelhante foi percorrido por outro atleta da mesma modalidade e também extremista, Maurício Souza, que após comentários homofóbicos nas redes sociais acabou sendo eleito deputado federal por Minas Gerais com mais de 83 mil votos.
Por fim, penso que, de posse do conhecimento desse repertório protocolar de procedimentos, a melhor atitude a ser tomada é o desprezo, em vez da enorme atenção dada a um sujeito cuja existência seria imperceptível em outras circunstâncias. O melhor a fazer é fortalecer o processo de desbolsonarização das instituições públicas e privadas deste país. Se bem, que pelo andar da carruagem, o próprio governo Lula não tem se ajudado muito nessa empreitada. Que o diga o ministro Juscelino Filho (Comunicação). Mas, aí, já é outra história.
Paulo Henrique Matos de Jesus é doutorando e mestre em História; pesquisador em História Social do Crime, Polícia e Segurança Pública.